quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O que você acha: o iPad e o Kindle vão matar o livro impresso?


No Fórum Econômico Mundial de Davos, em 2008, um especialista fez conjecturas sombrias sobre os principais acontecimentos dos próximos 15 anos no mundo. Um deles é o fim do livro.
O escritor Umberto Eco e o roteirista francês Jean-Claude Carrière refletem a respeito do futuro do livro
Um dos principais roteiristas de cinema da atualidade, o francês Jean-Claude Carrière – parceiro freqüente do diretor Luis Buñuel (“Esse obscuro objeto de desejo”) – parte desse ponto para refletir com o escritor italiano Umberto Eco (“O nome da rosa”) e o jornalista Jean-Philippe de Tonnac sobre o que a revolução tecnológica reserva para esta que é essa uma das maiores aventuras humanas: o livro.
Com os leitores de livros eletrônicos e os tablets – especialmente o Kindle, iPad e similares -, o livro impresso está fadado à extinção?, perguntam-se Carrière e Eco, também bibliófilos e amantes da palavra escrita.
Passeio pela cultura
Provocadora, a questão permeia silenciosamente a conversa entre eles em “Não contem com o fim do livro” (Editora Record), mas não é a principal preocupação deles. É antes um pretexto para uma viagem pela história do livro e da cultura ao longo dos séculos.
Mediados por Tonnac, Eco e Carrière valem-se das interrogações diante do futuro do livro impresso para, primeiro, reiterarem a certeza da sobrevivência de uma invenção que sobreviveu à Inquisição e outras fogueiras. E – aqui está a meu ver o grande achado dos diálogos entre Eco e Carrière – uma reflexão sobre as escolhas que a civilização fez a respeito de sua própria memória, ou seja, as razões que levaram o homem a preservar para a posteridade certos livros e autores em detrimento de outros e, assim, perpetuar uma certa visão de si mesmo.
Para eles, a cultura é, nesse sentido, tudo aquilo que ficou, em substituição ao que foi lançado no esquecimento. Numa época marcada pela revolução tecnológica e transformações profundas no comportamento da sociedade, não deveríamos nos fazer a mesma pergunta?

Livro eletrônico
É preciso alertar que “Não contem com o fim do livro” é uma homenagem ao livro sem com isso renegar os avanços tecnológicos, que nem Eco nem Carrière negam ou atacam. Articulador das conversas entre os dois intelectuais, o jornalista Tonnac resume bem o pensamento dos dois intelectuais sobre a questão:
“…se o livro eletrônico terminar por se impor ao livro impresso, há poucas razões para seja capaz de tirá-lo de nossas casas e de nossos hábitos; o e-book não matará o livro – como Gutenberg
(criador da forma moderna de impressão e responsável pela publicação do primeiro livro da história, a Bíblia ) e sua genial invenção não suprimiram de um dia para o outro o uso dos códices, nem este, o comércio dos rolos de papiros…”
“O filme matou o quadro? A televisão, o cinema? Boas-vindas às pranchetas e periféricos de leitura que nos dão acesso, através de uma única tela, à biblioteca universal doravante digitalizada”, escreve Tonnac no prefácio.
A finalidade das conversas entre Jean-Claude Carrière e Umberto Eco não era instituir sobre a natureza das transformações e perturbações talvez anunciadas pela adoção em grande escala (ou não) do livro eletrônico. Suas experiências de bibliófilos – colecionadores de livros
raros e antigos, pesquisadores e farejadores de incunábulos – os faz antes aqui considerar o livro , como a roda, uma espécie de perfeição insuperável da ordem do imaginário”, argumenta Tonnac.
Veja abaixo um pouco mais sobre o que Carrière e Eco pensam sobre internet, livros eletrônicos e escavações literárias ao redor do mundo.
Carrière: “…a questão a saber é se a evaporação definitiva do livro, se ele de fato vier a desaparecer, pode ter conseqüências, para a humanidade, análogas às da escassez de prevista da água, por exemplo, ou de um petróleo inacessível.”
Eco: “Na realidade, há muito pouca a dizer sobre o assunto. Com a Internet, voltamos à Era alfabética. Se um dia acreditamos ter entrado na civilização das imagens, eis que o computador nos reintroduz na galáxia de Gutenberg, e doravante todo mundo vê-se obrigado a ler. Para ler, é preciso um suporte. Esse suporte não pode ser apenas o computador. Passe duas horas lendo um romance diante de um computador, e seus olhos viram bolas de tênis”.
Carrière: “…nunca tivemos tanta necessidade de ler e escrever quanto em nossos dias. Não podemos utilizar um computador se não soubermos escrever e ler. E, inclusive de maneira mais complexa que antigamente, pois integramos novos signos, novas chaves. Nosso alfabeto expandiu-se” .
Eco: “Continuo simplesmente a me perguntar se, mesmo com a tecnologia mais bem adaptadas às exigências da leitura, será viável ler Guerra e Paz (Leon Tolstói) num e-book. Veremos. Em todo caso, não poderemos mais ler os Tolstói e todos os livros impressos na pasta de papel, pura e simplesmente porque eles já começam a se desfazer em nossas estantes. Os livros da Gallimard e da Vrin dos anos 1950 já desapareceram em grande parte.”
Carrière: “Quando surgiu o DVD, achamos que tínhamos finalmente a soluçãoideal que resolveria para sempre nossos problemas de armazenamento e acessibilidade (…) Nada disso. Agora nos anunciam discos num formato mais reduzido, que exige a aquisição de novos aparelhos de leitura, e que poderão conter, como no caso do e-book, um número considerável de filmes. Os bons e velhos DVDs serão jogados às traças, a não ser que conservemos velhos aparelhos que nos permitam projeta-los”.
Eco: “A aceleração contribui para a extinção da memória. Este é provavelmente um dos problemas mais espinhosos de nossa civilização (…) inventamos diversos instrumentos para salvaguardar a memória, todas as formas de registro, de
possibilidades de transportar o saber – é provavelmente uma vantagem em relação à época em que era necessário recorrer a mnemotécnicas, as técnicas para lembrar, pura e simplesmente
porque não era possível ter à sua disposição tudo o que convinha saber.”
E você, o que acha? Os leitores de livros eletrônicos e os tablets são uma ameaça ou aliados do livro? De que maneira as novas plataformas de leitura podem mudar a forma como nos relacionamos com o conteúdo escrito? Podem ser um estímulo a mais para que as novas gerações adquiram o prazer da leitura? Leremos mais? Menos? Leremos?
http://idgnow.uol.com.br/blog/navedigital/2010/08/04/conversas-sobre-ipad-kindle-e-o-possivel-fim-do-livro/

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